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A dublagem de animes na Crunchyroll e a importância do Brasil nesse mercado de streaming


Olá, leitor! No post de hoje vou falar sobre muitas questões em relação à Crunchyroll, como o processo de dublagem de um animê na plataforma e a importância do Brasil nesse mercado. Todo o conteúdo do post foi retirado de uma entrevista com o consultor da Crunchyroll, Yuri Petnys (também conhecido como Arara). A entrevista foi concedido para a Rádio Geek BR, em seu quadro otaku, o Anime Station. Bem, o texto está longo, espero que gostem ^^
(Eu e Yuri)

A relevância do Brasil na dublagem dos animes:

Baseado nos números da Crunchyroll, que são números abertos (e não no mercado em geral), O Brasil é um dos 5 maiores países no serviço de streaming, e o maior país de língua não-inglesa na plataforma. No top 5 países estão: Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Brasil e Austrália disputando pelo 4° e 5° lugar. Esse é o top dos países com mais assinantes, views, acesso e público. Se você contar a América Latina como um todo (pelo menos a parte que fala espanhol) a língua espanhola acaba ganhando no quesito de língua não-inglesa mais assistida na plataforma, mas, como país, o Brasil é um dos 5 maiores.

[Explicando para os leigos]: Os países espanhóis somados são maiores que o Brasil (e os países de língua portuguesa), mas o Brasil, isoladamente, é maior que qualquer um desses países espanhóis dentro desse top.
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O mercado brasileiro também é bem forte e interessante, tendo vários "primeiros lugares" na Crunchyroll, como é o caso da Crunchyroll TV (bloco que passava animes no canal Rede Brasil) que foi o primeiro bloco de televisão com o nome da Crunchyroll no mundo inteiro, nem nos EUA havia algo parecido. O Brasil também foi o primeiro país, fora os EUA, a promover o jogo Grand Summoners.

Quando você assina a Crunchyroll você ajuda o autor e/ou estúdio. Isso é verdade ?

Esse é um assunto muito complicado. Para entender isso você precisa ter uma noção de como funciona a indústria de animes. Quando a Crunchyroll licencia alguma coisa, de fato, a empresa entra em um contrato com as distribuidoras japonesas, e esse acordo (da Crunchyroll) é diferente do acordo de outras empresas (Netflix, Amazon), porque a Crunchyroll não efetua só o pagamento pela licença, mas também faz um revenue share de 50%, o que significa que, além da Crunchyroll pagar um valor X pra licenciar a série, 50% do lucro que aquela série prove para a Crunchyroll volta para o Comitê de Produção da obra. É basicamente por isso que a Crunchy pega várias animes que, por exemplo, a Netflix não pega, pelo fato da última pagar uma grande quantia de primeira mas não fazer esse revenue share. Isso é algo que a Crunchyroll usa como barganha.

Tá, mas como isso realmente funciona ?

Se o estúdio está no comitê de produção, que é algo raro, ele pega uma parte desse dinheiro que acaba voltando. Na maior parte das vezes esse dinheiro não volta para o estúdio em si, porque o comitê de produção paga um valor fixo para o estúdio produzir a série, contudo é importante entender que quanto mais lucrativo for o mercado internacional, mais pessoas estiverem assistindo de forma legal e tornar esse mercado mais lucrativo mais séries serão produzidas e terão um melhor conteúdo.

Também é importante notar que quando um comitê de produção se dispõe a produzir um anime, como Mob Psycho 100 por exemplo, ele (comitê) está correndo um risco, e ele só tomaria esse risco para si caso acredite que vai ter um retorno de alguma forma em todos os canais de monetização que esse comitê tem, seja televisão ou o mercado internacional de streaming e licenciamento. E quanto mais dinheiro o comitê de produção achar que vai obter mais dinheiro eles irão conseguir colocar na produção da série. Se o comitê achar, por exemplo, que Mob Psycho 100 vai ser um estouro se esperarem mais 3 meses para que a obra seja lançada ele (comitê) vai dar um tempo maior para a produção do animê, o que vai fazer a obra ter um resultado final melhor.

Logo, quanto mais dinheiro estiver circulando melhores vão ficando as condições. Se olharmos de 2005 para cá, a quantidade de produção de animes em cada ano foi só aumentando. Nesse período de 15 anos os números de animes produzidos por ano quase triplicou.

Estão sendo produzidos mais, primeiro, porque o mercado de streaming está em uma constante busca de mais conteúdo. Então você vê empresas como a Netflix e Amazon disputando cada vez mais para pegar uma parcela desse conteúdo e, por incrível que pareça, mesmo triplicando a quantidade de títulos a qualidade deles não, necessariamente, caiu [em alguns casos, sim], geralmente é esperado que, por conta na imensa quantidade de séries, os estúdios produzam com mais pressa, ou que esses estúdios acabem pegando múltiplos projetos, assim deixando a qualidade de alguns bem abaixo do esperado [como tem acontecido em alguns casos].

A competição

Esse fator cria uma competição no mercado, assim os estúdios acabam disputando para fazer com que sua série se destaque em meio às outras. Em 2018 e 2019, por exemplo, houve uma série de títulos excelentes, um atrás do outro.

Novas técnicas

Por conta desses fatores os estúdios se vêem na obrigação de atrair mais animadores de outros países e atrair novas empresas de animação. E são exatamente estas empresas que dão origens a novas técnicas, como é o caso da grande quantidade de coisas baseadas em rotoscopia no animê Yuri on Ice.



Esse tipo de inovação surge da necessidade de produzir cada vez mais séries, e isso existe graças ao apoio da indústria internacional.

Como é o processo de escolha de dublagem de animes ?

A primeira coisa que é preciso entender sobre a dublagem internacional na Crunchyroll é que, quando se faz a dublagem de um animê, ela é feita para 4 línguas além do inglês, sendo elas: espanhol, português, francês e alemão.

A decisão das séries que vão ser dubladas não levam em conta apenas as preferências do público brasileiro, levam a preferência de cada um desses públicos citados. Logo, não é porque um animê é popular aqui no Brasil que a Crunchyroll vai dublá-lo, para essa ação fazer sentido a obra teria que ser popular em pelo menos 2 ou 3 mercados, esse é o primeiro fator.

O segundo fator é que dublar é um processo muito mais caro e demorado do que o processo de legenda. A legenda pode ser feita com uma equipe pequena em um tempo hábil, já no caso da dublagem é preciso de, pelo menos, um diretor de dublagem, um editor de som e cada um dos dubladores, que tem seus próprios cronogramas. Ou seja, é um processo bem demorado.

Também tem o processo de popularidade e a questão de mercado. Logo não faz sentido a Crunchyroll dublar, por exemplo, The Testament of Sister New Devil que é uma série relativamente popular mas que tem bastante ecchi, o que é um empecilho quando se trata de transmissão na TV. Não estou dizendo que The Testament of Sister New Devil nunca vai ser dublado, pode ser que seja, o mundo é imprevisível.
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Também é importante saber se a obra pode ser monetizada de outras formas, ou se ela é popular em outros países, não só no Brasil. Todos esses fatores colaboram para saber se um título será ou não dublado pela Crunchyroll, nunca é uma decisão simples.

[A Crunchyroll recomendo que, caso haja algum animê que você gostaria de ver dublado, mande mensagem nas mídias sociais da empresa]

Sobre a dublagem de animes clássicos (como Cavaleiros do Zodíaco):

Muitas vezes o público não sabe que existem determinados animes dublados no catálogo da Crunchyroll, como é o caso de Cavaleiros do Zodíaco, que inclusive só está disponível dublado, pelo fato da Crunchyroll não ter o acesso ao áudio em japonês. Essa "falta de conhecimento" do público por parte dos animes dublados no catálogo da Crunchy se deve, muito pelo fato, de não ter uma opção de mudar de idioma, como é o caso da Netflix. Na plataforma da Crunchyroll o assinante deve colocar o nome do animê + "dublado" do lado, caso exista dublagem do animê.

Empecilhos no licenciamento da dublagem de clássicos...

O primeiro empecilho é no caso de pegar um anime cuja produtora não existe mais. Por exemplo, é muito difícil pegar um anime que foi dublado pela Rede Manchete, porque ela não existe mais, e descobrir quem detém os direitos da dublagem da Rede Manchete é um trabalho para vários advogados.

[Você não vai pegar uma dublagem de VHS, dar uma limpada no áudio e colocar na plataforma, não é assim que as coisas funcionam].

O segundo, e mais importante, empecilho é que, às vezes, a empresa até detém os direitos da dublagem clássica da série, porém esta empresa não quer perder tempo negociando. Imagine que você é uma produtora de animê e está com séries que acabaram de ser lançadas, logo está se preocupando com o merchandising e até venda de DVDs, aí chega um cara e fala: "Em 1985 vocês lançaram uma série de 26 episódios que estava assim e assado e que ninguém liga, só aqui no Brasil. Vocês se importariam de pegar seus antigos arquivos e dar uma limpada e tal só pra vocês licenciarem para o Brasil ? Vocês estariam interessados ? Nós vamos pagar essa merreca aqui, porque é o valor que a gente acha justo", é algo que nenhuma empresa vai aceitar.
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Bem, leitores, esse foi o post de hoje, espero que tenham gostado e que eu tenha esclarecido as dúvidas de vocês, abaixo vocês conferem a entrevista que foi usada de base para este texto. Até a próxima!



(As referências utilizadas no vídeo começam a partir de 34:11)

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